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Comentário ao "breve catecismo sobre o sedevacantismo"

Comentarei brevemente alguns trechos que se encontram no texto amplamente divulgado nas mídias do tradicionalismo "reconhecer e resistir", intitulado "breve catecismo sobre o sedevacantismo". Os trechos são destacados em vermelho e os comentários vêm em seguida.


"A principal causa desta crise [do Concílio Vaticano II] tem sido a negligência dos Pontífices Romanos, que ensinam ou permitem a disseminação de erros graves sobre o ecumenismo, a liberdade religiosa, a colegialidade, etc."


Não se pode dizer que a disseminação desses erros pelos ocupantes da Sé de Pedro têm como causa a negligência. Esses erros são disseminados deliberada e conscientemente por esses homens. Seria de uma ingenuidade culposa alguém crer que estes "papas" estivessem alheios aos erros que eles mesmos ensinam, e que os negligenciassem como se fossem inocentes daquilo que ocorre ao seu redor. O autor do texto comete um grande sacrilégio ao considerar que um verdadeiro Papa ensine um erro grave (leia-se: erro contra a fé, heresia) mesmo depois da oração de Cristo que conferiu a São Pedro fé infalível. É o que ensina o Papa Leão IX:


"[...] assim a própria Verdade promete, por meio daqueles que são verdadeiros, tudo aquilo que é verdadeiro: “As portas do inferno não prevalecerão contra ela” [Mt 16,18]. O mesmo Filho declara que obteve o efeito desta promessa do Pai por meio de orações, dizendo a Pedro: “Simão, eis que Satanás etc.” [Lc 22,31]. Portanto, haverá alguém tão tolo a ponto de ousar considerar sua oração de qualquer maneira vã, cujo querer é poder? Pela Sé do chefe dos Apóstolos, ou seja, pela Igreja Romana, pelo mesmo Pedro, bem como por seus sucessores, os comentários de todos os hereges não foram reprovados, rejeitados e vencidos, e os corações dos irmãos na fé de Pedro, que até agora não falhou, nem falhará até o fim, foram fortalecidos?


"Os sedevacanstistas estão de acordo uns com os outros? Não, pelo contrário. Há muitas posições diferentes."


Quanto ao essencial, qual seja, de que a Sé de Pedro está vacante e que seus ocupantes recentes são falsos, todos estão de acordo. As divergências se dão em grande parte pelas diversas opiniões de como será resolvida a questão da Sé vacante quanto à eleição de um Papa válido, que é uma outra discussão, posterior à posição sedevacantista. Essa discussão é muito semelhante, inclusive, a que se faz nos meios tradicionalistas, pois, ainda que considerem estes hereges como papas, discutem entre si como um Papa ortodoxo poderá surgir de uma hierarquia modernista. Ademais, os tradicionalistas também não estão de acordo entre si em diversos pontos, donde surgem diversos grupos que "resistem" ao papa em graduações diferentes. Uns querem viver como sedevacantistas práticos, ignorando solenemente tudo o que dizem os papas e a hierarquia da igreja pós-conciliar, como se não existissem. É o caso do grupo Resistência de Mons. Williamson. Já a FSSPX adota uma posição política de aproximação e conciliação com a hierarquia pós-conciliar, tentando obter daí alguma vantagem (sabe-se lá qual, afinal, que vantagem se poderia obter de apóstatas, hereges e cismáticos?). Mas, apesar dessa posição política, rechaçada pela Resistência, também vivem como sedevacantistas práticos, sagrando e ordenando seus bispos e padres, fundando seus seminários e administrando os sacramentos à revelia do papa e da Santa Sé. Já outros, como o IBP, reconhecem e se submetem quase integralmente à essa hierarquia, que lhes concede o direito de existir desde que sua crítica aos frutos do CVII não ultrapasse um certo limite, limite esse que, não raro, ultrapassam, revelando uma desobediência àqueles que juram obedecer. Há ainda os grupos Ecclesia Dei, que, amparados pelo Motu Proprio Summorum Pontificum, agora revogado por Bergoglio, se limitavam a rezar a Missa Tridentina por uma questão de preferência litúrgica, cujas críticas eram feitas veladamente, uma vez que se encontravam totalmente submetidos à autoridade dos "bispos" locais. Além disso, nota-se claramente entre os fiéis tradicionalistas desses diferentes grupos uma constante desconfiança criada por clima de policiamento, onde cada grupo se arvora detentor da verdadeira ortodoxia da fé, criando rixas entre si. Obviamente essa confusão geral apenas reforça o fato de que as ovelhas estão dispersas pois não há o Pastor para as reger.


A principal dificuldade do sedevacantismo reside em explicar como é possível que a Igreja possa continuar a existir visivelmente (pois recebeu a promessa de Nosso Senhor de que ela perdurará até o fim do mundo) se for despojada de sua cabeça.


Não há nenhuma dificuldade, pois é perfeitamente possível que a Igreja continue a existir temporariamente sem um Papa. Tanto é possível que isso sempre ocorre entre a morte de um Papa e a eleição de seu sucessor. Poderiam então argumentar: "mas isso dura apenas alguns dias!". Já houve, na história da Igreja, intervalos que duraram mais de um ano. Ora, o que determina o limite para esse intervalo? A partir de qual intervalo passa-se a considerar que a visibilidade da Igreja cessou e ela deixou de existir? Há algum documento do Magistério que determine tal limite? É claro que não. Obviamente, estamos num período de Sé vacante anormal, pois a sua causa é diversa da causa natural da morte do Papa; estamos diante de uma causa sobrenatural, visto que, em primeiro lugar, trata-se de um tremendo castigo de Deus ao homem moderno, que é confundido pela sua tremenda impiedade (Sl 55,9). Em segundo lugar, a causa da Sé vacante atual é sobrenatural pois se deve justamente à falta do dom sobrenatural da fé nos usurpadores da Cátedra de Pedro, os quais, por isso mesmo, não podem ocupar esta Cátedra, protegida por Cristo pela promessa da infalibilidade da fé.


"Os partidários da chamada "Tese de Cassiciacum" [2] criaram uma solução bastante astuta..."


Eu chamaria de "solução astuta" esta de "reconhecer e resistir" a um Papa válido, peneirando seus atos de magistério e de governo, desobedecendo-o ao próprio gosto, e ainda assim considerar-se católico, contrariando o ensinamento de tantos Papas:


"Além disso, declaramos, proclamamos, definimos que é absolutamente necessário para a salvação que toda criatura humana esteja sujeita ao Romano Pontífice." (Papa Bonifácio VIII, Bula Unam Sanctam);


Para que, no futuro, se evitem todas as ocasiões de erro, e que todos os filhos da Igreja Católica aprendam a ouvir a própria Igreja , não apenas em silêncio (pois, “até os ímpios se calam nas trevas” [I Sm 2,9]), mas com uma obediência interior, que é a verdadeira obediência de um homem ortodoxo..." (Papa Clemente XI, Constituição Apostólica Vineam Domini Sabaoth);


"Como, de fato, pode-se dizer que se mantém a comunhão com a cabeça visível da Igreja, quando esta se limita a anunciar apenas o fato da eleição, e ao mesmo tempo é feito um juramento que nega a autoridade de seu primado? Na qualidade de cabeça, todos os seus membros não lhe devem a solene promessa de obediência canônica, a única que pode manter a unidade na Igreja e evitar cismas neste corpo místico fundado por Cristo nosso Senhor?" (Papa Pio VI, Carta Apostólica Quod Aliquantum).


Astuta é esta teoria de um papa de duas cabeças, que ora age como Papa da Igreja Católica Apostólica Romana, ora age como seu inimigo, ou ainda, como papa da "contra-Igreja" (para usar o termo consagrado por Dom Lefebvre), teoria absurda em si mesma, uma aberração teológica que coloca o Papa como chefe de duas igrejas distintas e opostas, e portanto como destruidor da unidade da Igreja:


"Portanto, não é de surpreender que em épocas passadas aqueles que o velho inimigo do gênero humano encheu com seu próprio ódio à Igreja, tivessem o hábito de atacar em primeiro lugar esta Sé que mantém a unidade em todo o seu vigor [...]. Enquanto Santo Agostinho nos diz que 'é na cadeira da unidade que Deus colocou a doutrina da verdade'" (Papa Pio VI, Bula Super Soliditate).


Ao contrário do que dizem esses pseudo-tradicionalistas, a visibilidade da Igreja não depende da mera existência de um ocupante na Sé de Pedro, e sim da fortaleza desta Sé, cuja força está na infalibilidade da fé de São Pedro, pois esta fé inabalável é o que a sustenta:


Nunca houve um inimigo da religião cristã que não estivesse simultaneamente em guerra perversa com a Sé de Pedro, pois enquanto esta Sé permanecesse forte, a sobrevivência da religião cristã estava assegurada. Como Santo Irineu proclama abertamente a todos, “pela ordem e sucessão dos Romanos Pontífices, chegou até nós a tradição dos Apóstolos na Igreja e o anúncio da verdade. E esta é a demonstração mais completa de que é a única e mesma fé vivificante que foi preservada na Igreja até agora desde o tempo dos apóstolos e foi transmitida em verdade” (Papa Pio VII, Encíclica Diu Satis).


"Assim, de acordo com a teoria [de Cassisiacum], o papa pode agir de certa forma para o bem da Igreja, como, por exemplo, nomear cardeais (que, por sua vez, são cardeais materialiter), mas ele não é realmente papa."


É perfeitamente possível que um homem, mesmo não sendo Papa, faça algum bem, ainda que pequeno, à Igreja. Em contrário, é absolutamente impossível que um homem, sendo Papa, faça o mal, ainda que pequeno, à Igreja, na sua missão de ensinar, governar e santificar o povo de Deus. Como já foi explicitado, a Cátedra de Pedro está protegida de erros dessa natureza. Os pseudo-tradicionalistas fazem aí uma inversão lógica completa do problema.


Além disso, isso não resolve a principal dificuldade do sedevacantismo, ou seja, como a Igreja pode permanecer visível se papas, cardeais, bispos, etc., forem privados de sua "forma", deixando assim a Igreja sem qualquer hierarquia visível.


A Igreja permanece visível nos bispos, padres e leigos que se mantém fiéis à verdadeira doutrina apostólica, a qual insistentemente repete a verdade evangélica de que Cátedra de São Pedro está imune de erros e seus sucessores gozam de fé infalível. Ora, os "papas" pós-conciliares cometeram vários erros contra a fé e a moral. Logo, não gozam desta infalibilidade, e por isso, não são verdadeiros sucessores de São Pedro. Esta verdade é tão simples quanto verdadeira.


Por outro lado, essa teoria tem alguns erros filosóficos graves porque assume que uma cabeça pode ser materialiter, ou seja, não tem autoridade.


Uma "cabeça materialiter" não tem autoridade, mas uma cabeça herética e apóstata sim. É isso o que diz o autor do texto. Absurdo.


"Mas se o que Francisco frequentemente faz são afirmações ou declarações heréticas que levam à heresia, então não pode ser tão facilmente demonstrado que ele conscientemente rejeita algum dogma da Igreja. E enquanto não houver provas concretas, a coisa mais prudente a fazer é não julgar."


Essa frase é um perfeito non-sequitur. Ora, quem faz declarações heréticas que levam à heresia é um herege. Se o herege repete obstinadamente heresias (como é o caso de Bergoglio), isto já é a prova concreta de que é um herege. Nesse caso já não cabe julgamento, pois o herege já está julgado ipso facto, ou seja, pelo próprio fato da manifestação externa de sua heresia. Ademais, é absurda essa insinuação de que Bergoglio ou qualquer "papa" da seita conciliar são meramente hereges materiais, como se padecessem de ignorância invencível, ou seja, como se não tivessem consciência de estarem negando o Magistério de seus predecessores, que arduamente combateram e anatematizaram as doutrinas que esses infelizes homens agora proclamam. A própria ideia de um Papa invencivelmente ignorante em matéria de fé e moral é ridícula em si mesma, pois como poderia um Papa governar a Igreja e confirmar seus irmãos numa fé que ele ignora? Na história da Igreja, os Papas sempre foram eleitos por serem homens doutos e de sã doutrina, de fé firme e íntegra. Estes requisitos são absolutamente necessários para o papado, uma vez que ninguém pode dar aquilo que não tem.


"Se um católico estivesse certo de que Francisco é um herege formal e manifesto, deveria então concluir que ele já não é papa? Não, não deveria, porque de acordo com a opinião "comum" (Suarez), ou mesmo a opinião "mais comum" (Billuart), os teólogos acreditam que mesmo um papa herético pode continuar a exercer o papado."


Essa "opinião comum" é bastante questionável, pois São Roberto Belarmino, doutor da Igreja, em seu tratado De Romano Pontifice expõe que a opinião mais comum, desde os Pais de Igreja até Santo Tomás, é a de que o herege manifesto 1) não pode ser eleito Papa; 2) caso manifeste a heresia depois de eleito, deixa de ser Papa automaticamente e perde sua jurisdição, sem necessidade de julgamento. São Roberto Belarmino ainda refuta a posição de Caetano de que um Papa herético só pode ser deposto após julgamento da Igreja. Pois bem, ninguém em sã consciência negará que estes homens auto-proclamados papas são hereges manifestos, conscientes e obstinados, e portanto, hereges formais.


O padre dominicano Garrigou-Lagrange, confiando em Billuart para seu raciocínio, explica em seu tratado De Verbo Incarnato (p. 232) que um papa herético, mesmo que ele não seja mais um membro da Igreja, pode permanecer sua cabeça, porque o que é impossível no caso de uma cabeça física é possível (embora anormal) para uma cabeça jurídica secundária.


A resposta para isso é muito simples: o padre Garrigou-Lagrange errou ao confiar numa falsa posição teológica, que, como já dito, foi refutada por São Roberto Belarmino sobre a opinião de Caetano, que, ao contrário do padre Garrigou-Lagrange, se baseia numa autoridade superior da teologia autorizada do Magistério da Igreja:


"Um Papa que é manifestamente um herege automaticamente deixa de ser Papa e Cabeça, tal como ele deixa automaticamente de ser cristão e um membro da Igreja. Por conseguinte, ele pode ser julgado e punido pela Igreja. Este é o ensinamento de todos os Padres da antiguidade que ensinam que hereges manifestos perdem automaticamente toda a jurisdição."


"Os Santos Padres ensinam em uníssono, que não apenas são hereges fora da Igreja, mas também carecem de toda jurisdição e dignidade eclesiástica ipso facto. Cipriano diz: “Nós dizemos que todos os hereges e cismáticos não têm poder e direito”. Ele também ensina que os hereges que retornam à Igreja devem ser recebidos como leigos; mesmo que antes fossem sacerdotes ou bispos na Igreja. Optato ensina que hereges e cismáticos não podem ter as chaves do reino dos céus, nem afrouxar ou atar. Ambrósio e Agostinho ensinam o mesmo, assim como São Jerônimo que diz: “Os bispos que foram hereges não podem continuar a sê-lo; antes que sejam constituídos como aqueles que foram recebidos que não eram hereges”. Papa Celestino I, em uma epístola a João de Antioquia, diz: “Se alguém que foi excomungado ou exilado pelo bispo Nestório, ou qualquer um que o seguisse, desde o momento em que começou a pregar tais coisas, sejam eles da dignidade de bispo ou clero, é manifesto que ele suportou e perdura em nossa comunhão, nem o julgamos fora, porque ele não poderia afastar ninguém por uma sentença, que ele mesmo já havia demonstrado que deveria ser removido."


"No entanto, os hereges estão fora da Igreja, mesmo antes da excomunhão, e privados de toda jurisdição, pois são condenados por seu próprio julgamento, como o apóstolo ensina a Tito; isto é, eles são cortados do corpo da Igreja sem excomunhão, como Jerônimo o expressa."


"Em seguida, até mesmo São Tomás ensina que os cismáticos logo perdem toda a jurisdição; e se eles tentam fazer algo da jurisdição, é inútil." (São Roberto Belarmino, De Romano Pontifice, II, 30).


Vale lembrar ainda que São Roberto Belarmino é doutor da Igreja, título esse agraciado pelo carisma da infalibilidade papal, assim como a canonização dos santos, de tal modo que os santos doutores da Igreja contém doutrina segura e livre de quaisquer erros contra a fé. Daí que entre o exposto por São Roberto Belarmino e pelo padre Garrigou Lagrange há uma distância intransponível de autoridade.


"Em suma, o Papa é feito membro da Igreja por sua fé pessoal, que ele pode perder, mas ele é o chefe da Igreja visível pela jurisdição e autoridade que recebeu, e estes podem coexistir com sua própria heresia."


Teoria sacrílega, pois a autoridade do Papa vem de Cristo, que a conferiu a São Pedro: "apascenta [rege] as minhas ovelhas" (S. Jo 21,15). E disse ainda: "quem vos ouve, a Mim ouve, e quem vos rejeita, a Mim rejeita" (S. Lc 10,16). Ou seja, ouvir o Papa, o Vigário de Cristo, é ouvir o próprio Cristo; mas quando um homem apóstata e blasfemo como Bergoglio é considerado Papa, isso também é uma blasfêmia, pois é o mesmo que dizer que Jesus Cristo Nosso Senhor escolheu um homem perverso para reger suas ovelhas e levá-las aos pastos da condenação eterna, contrariando o próprio Deus, que pela boca de São Paulo diz que "deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade" (I Tm 2,4). É impossível, portanto separar a autoridade da sua integridade de fé, pois aquela decorre desta.


"Os sedevacantistas baseiam sua posição na constituição apostólica Cum ex Apostolatus, do Papa Paulo IV (1555 – 1559). Mas alguns estudos mostraram que essa constituição perdeu sua validade jurídica quando o Código de Direito Canônico de 1917 foi promulgado."


Os sedevacantistas se baseiam em muitos outros textos do Magistério da Igreja. A constituição apostólica Cum ex Apostolatus apenas descreve mais explicitamente o que já constava no Magistério anterior. Tampouco ela perdeu a validade, como é demonstrado aqui.


"De fato, os sedevacantistas acreditam, em geral, que o ensino do Concílio deveria ter sido coberto pela infalibilidade do Magistério ordinário e universal e, portanto, não deveria conter nenhum erro. Mas, como tem erros, por exemplo, liberdade religiosa, então eles concluem que Paulo VI tinha deixado de ser Papa naquela época. Na verdade, se esse argumento fosse aceito, teria que ser dito que toda a Igreja Católica então desapareceu também, e que os "portões do inferno prevaleceram" contra ela, porque o ensino do Magistério ordinário e universal é o mesmo dos bispos, o mesmo que o de toda a Igreja."


Eis aí mais uma inversão lógica que os pseudo-tradicionalistas fazem, pois, ao contrário do que dizem, os portões do inferno prevaleceriam sobre a Igreja se a tese deles do "papa herético" fosse verdadeira. O que garante a indefectibilidade da Igreja é a infalibilidade papal, da qual depende a infalibilidade do Magistério Ordinário Universal (MOU). O MOU só pode ser infalível em união ao Papa, o verdadeiro detentor do poder das chaves, as quais foram dadas somente ao sucessor de São Pedro. Um herege não pode possuir as chaves; imagine um herege como Bergoglio com o poder de ligar e desligar suas heresias... É esse absurdo que os pseudo-tradicionalistas defendem. Uma igreja chefiada por um "papa" que falha na maior parte do tempo é uma igreja defectível como qualquer igreja dos hereges e cismáticos, e as portas do inferno (as heresias) podem prevalecer sobre ela. O Papa (verdadeiro) é o único obstáculo definitivo à heresia; é o porto seguro ao qual toda a Igreja se dirige nos momentos de dúvida e vacilos contra a fé, com confiança filial no poder que Cristo lhe conferiu. Um papa sem esse poder não é papa, assim como o juiz sem o poder de julgar não é um juiz.


"É mais fácil acreditar que o ensino do Concílio e da Igreja Conciliar não está coberto pela infalibilidade do Magistério ordinário e universal. [...] Como esse ensino não é imposto com autoridade, não está coberto pela garantia de infalibilidade."


O Concílio Vaticano II de fato não está coberto pelo carisma da infalibilidade, porque os homens que o promulgaram e ratificaram são inimigos da fé católica, a saber, os filo-maçons Roncalli e Montini. Porém, os pseudo-tradicionalistas invocam a falibilidade do CVII a partir de uma falsa tese: a de que estes dois "papas" teriam abdicado de promulgar dogmas em seus documentos e instaurado um concílio "meramente pastoral". Com isso concluem que o CVII não foi infalível e no qual sequer o MOU (que goza da mesma infalibilidade do Magistério Extraordinário e solene) se manifestou, e mais, se tratou apenas de um "diálogo", uma sugestão de diretrizes pastorais às quais a hierarquia da Igreja poderia assentir ou declinar livremente. Nisso são refutados pelo próprio Montini (Paulo VI):


"Não sendo só especulativo nem só negativo, o múnus do magistério eclesiástico deve neste Concílio manifestar cada vez mais a força vivificadora da mensagem de Cristo, que disse: as palavras, que Eu disse, são espírito e vida";


“Cremos ter chegado a hora em que a verdade acerca da Igreja de Cristo há de ser aprofundada, ordenada e expressa, não talvez com aqueles enunciados solenes que se chamam definições dogmáticas, mas por meio de declarações do magistério ordinário, mais explícito e autorizado, que digam à Igreja o que ela própria pensa de si mesma.” (Discurso solene de abertura da segunda sessão do Concílio. Paulo VI, 29 de setembro de 1963)


Fica evidente que Montini aqui diz estar usando da autoridade do Magistério Ordinário, o qual, no contexto de um Concílio Ecumênico da Igreja, é universal, ou seja, ensinado e imposto para toda a Igreja, e por isso mesmo goza (em tese) do carisma da infalibilidade, pois que o erro não pode ser ensinado universalmente pela Igreja para a perdição das almas. Ademais, Montini deixa claro que o CVII é uma continuação do CVI (o qual foi proclamado pela autoridade infalível do Papa):

"Não hesitamos em dizer-vos ser com viva expectativa e sincera confiança que esperamos este debate, o qual – mantendo-se embora firmes as declarações dogmáticas do primeiro Concílio Ecumênico Vaticano relativas ao Pontificado Romano –, deverá agora aprofundar a doutrina sobre o Episcopado, as suas funções e as suas relações com Pedro." (Discurso solene de abertura da segunda sessão do Concílio. Paulo VI, 29 de setembro de 1963).


A pá de cal sobre essa teoria pseudo-tradicionalista do "concílio meramente pastoral, falível e portanto desobedecível" é jogada por Montini no documento de encerramento do CVII, no qual fica evidente a sua intenção de se utilizar da suprema autoridade de Chefe e Pastor Universal da Igreja para aprovar solenemente os documentos do Concílio e impor sua obediência a todo o orbe católico:


“Assim, pois, com a graça de Deus, estando neste momento terminado tudo quanto diz respeito ao mesmo sagrado Concílio Ecumênico e tendo sido aprovadas por deliberação conciliar e por nós promulgadas todas as constituições, decretos, declarações e votos, com a Nossa autoridade apostólica decidimos e estabelecemos encerrar, para todos os efeitos, o mesmo Concílio Ecumênico..."


"Mandamos também e ordenamos que tudo quanto foi estabelecido conciliarmente seja observado santa e religiosamente por todos os fiéis, para glória de Deus, honra da santa madre Igreja, tranquilidade e paz de todos os homens. Isto sancionamos e estabelecemos, decretando que a presente carta seja e permaneça plenamente firme, válida e eficaz; que tenha e consiga os seus efeitos plenos e íntegros; que seja apoiada por aqueles a quem, agora ou no futuro, diz ou poderá dizer respeito; que assim se deve julgar e definir; e que desde este momento se deve ter como nulo e sem valor tudo quanto se fizer em contrário, por qualquer indivíduo ou autoridade, conscientemente ou por ignorância." (Paulo VI, Carta Apostólica In Spiritu Sancto, 08 de dezembro de 1965).


"Mas os sedevacantistas não estão certos em se recusar a nomear o Papa na missa para mostrar que eles não estão em comunhão (una cum) com um herege (pelo menos materialmente) e suas heresias? A expressão una cum no Cânon da Missa não significa que se afirma estar "em comunhão" com as ideias errôneas do Papa, mas sim que se quer rezar pela Igreja "e pelo" Papa, sua cabeça visível."


Como já demonstramos, não se trata de hereges "pelo menos materiais" (o autor insiste nessa tese ridícula). São evidentemente hereges formais que, se colocados no altar de Cristo, no momento mais solene do evento mais alto da Santa Igreja que é a Santa Missa, configurará sem dúvida num tremendo sacrilégio. É a concretização mais visível da "abominação da desolação no lugar santo" (S. Mt 24,15).


Quanto à significação do termo "una cum", basta recorrer à tradução imediata e literal do termo: una cum = junto com, unido com. Mas isso é um pormenor. Mesmo concedendo que o termo não signifique "unido com" e sim "e por, e pelo", ainda resta o problema de se estar rezando por um herege formal, público, notório e manifesto, ou mais ainda, por um apóstata, visto que estes homens negam princípios fundamentais da fé católica dos quais depende a fé como um todo (como demonstrarei num outro texto). Quanto a essa prática de se rezar com/pelos hereges, apóstatas e cismáticos, a Igreja ensina:


"Se alguém vem a vós e não traz esta doutrina, não o recebais em vossa casa, nem o saudeis, porque, quem o saúda, participa (em certo modo) das suas obras más" (II S. Jo 1,10-11);


"Mas escrevi-vos que não tenhais comunicação com aquele que, chamando-se irmão, é fornicador, ou avarento, ou adorador de ídolos, ou maldizente, ou bêbado, ou vive de rapina, com este tal nem comer deveis" (I Cor 5, 11);


"Não se deve rezar com hereges ou cismáticos" (Concílio de Laodicéia, Cân. 33);


"Mas que os fiéis de Cristo e os homens eclesiásticos orem pela unidade cristã guiados por hereges e, o que é pior, segundo uma intenção em grande maneira manchada e infectada de heresia, não se pode de nenhum modo tolerar" (Carta do Santo Ofício aos Bispos da Inglaterra, 16 de Setembro de 1864.);


"Assim sendo, é manifestamente claro que a Santa Sé não pode, de modo algum, participar de suas assembleias [dos hereges] e que, aos católicos, de nenhum modo é lícito aprovar ou contribuir para estas iniciativas: se o fizerem concederão autoridade a uma falsa religião cristã, sobremaneira alheia à única Igreja de Cristo" (Papa Pio XI, Encíclica Mortalium Animos);


E, portanto, espero merecer estar numa só comunhão convosco, que proclama a Sé Apostólica, na qual está a íntegra, verdadeira e perfeita solidez da fé cristã, prometendo que, no futuro, os nomes daqueles que se separaram da comunhão da Igreja Católica — isto é, daqueles em desacordo com a Sé Apostólica — não serão lidos nos mistérios sagrados. (Papa São Hormisdas, Libellus professionis fidei, acrescentado à epístola “Inter ea quae” aos bispos da Espanha, 2 de Abril de 517)


"Pois os sagrados cânones da Igreja proíbem a oração pública pelos excomungados, como se pode verificar no capítulo A nobis, 2, e no capítulo Sacris da sentença de excomunhão. Embora isto não proíba a oração pela sua conversão, ainda assim, tais orações não podem tomar a forma de proclamação de seus nomes na oração solene durante o santo sacrifício da Missa.” (Papa Bento XIV, Encíclica Ex Quo Primum)


“Por esta razão, o bispo de Constantinopla, João, declarou solenemente ― e após ele, todo o Oitavo Concílio Ecumênico fez o mesmo ― ‘que os nomes daqueles que foram separados da comunhão da Igreja Católica, isto é, daqueles que não concordam em todos os pontos com a Sé Apostólica, não devem ter os seus nomes lidos durante os sagrados mistérios’” (Papa Pio IX, Encíclica Quartus Supra)

Não há como ser mais claro que isso. A simples menção do nome de um herege na Santa Missa já se configura um ato censurável pela Igreja. Não se deve ter parte nenhuma com eles, nem participar de nada que os envolva. A atitude do católico, ao detectar o herege, é afastar-se dele como a vítima se afasta de seu predador.


"São Tomás diz: "Para que este sacrifício alcance seu efeito (effectum habet) aqueles por quem se reza devem estar 'unidos à Paixão de Cristo pela fé e caridade'. Não diz que rezar por hereges é proibido. Ele simplesmente diz que essa oração não será tão eficaz como uma oração seria para um católico, e não está prevista no Cânon. [...] A única coisa que pode ser tirada como conclusão a partir dessa declaração de São Tomás é que, se o Papa é um herege (o que ainda não está provado), então a oração dita por ele não terá o efeito pretendido, não habet effectum."


Pelo comentário anterior fica demonstrado que não se deve mencionar hereges no cânon da Missa. Obviamente Santo Tomás não contraditaria o Magistério da Igreja. Por isso, vamos analisar a citação na íntegra:


"[...] deve-se dizer que a paixão de Cristo traz proveito a todos para a remissão da culpa, a obtenção da graça e da glória, mas o efeito só é produzido naqueles que se unem à paixão de Cristo pela fé e caridade. Assim também este sacrifício, que é o memorial da paixão do Senhor, só produz efeito naqueles que se unem a este sacramento pela fé e caridade. Daí, o ensinamento de Agostinho: "Quem oferecerá o corpo de Cristo a não ser por aqueles que são membros de Cristo?" Por isso, na Oração Eucarística não se reza por aqueles que estão fora da Igreja. Aproveitam, no entanto, mais ou menos segundo a medida de sua devoção" (Summa Theologica, III, q. 79, a. 7).


Vemos então que Santo Tomás, repetindo Santo Agostinho, diz claramente o que já foi exposto: não se reza por hereges, cismáticos e apóstatas, ou seja, pelos que estão excluídos do Corpo de Cristo, como é o caso dos falsos papas da igreja conciliar.


O sedevacantismo é uma teoria que não está comprovada a nível especulativo, e é imprudente submeter-se a ela a nível prático (uma imprudência que pode ter consequências muito graves).


Demonstramos o contrário ao longo deste comentário, recorrendo sempre aos textos do Magistério da Igreja e dos santos doutores. O que é imprudente é submeter-se à teoria "reconhecer e resistir" dos pseudo-tradicionalistas e aos seus sofismas, esses sim especulativos e inéditos. As consequências dessa teoria são graves, porque ao ensinarem que se pode resistir ao governo e ensino de um Papa legítimo e que um grupo de leigos e sacerdotes podem alçar-se à posição de juízes que filtram o Magistério papal, colocam-se na prática como a autoridade máxima da Igreja, acima do próprio Papa. Doutrina perigosa e perversa e que deve ser evitada a todo custo pelos católicos, como reiteraram tantas vezes os Papas católicos nos textos expostos acima e em tantos outros que não foram citados. "É por isso que Dom Lefebvre nunca adotou essa posição, e até proibiu os sacerdotes da FSSPX de professá-la." Falso. Dom Lefebvre não tinha a posição sedevacantista como impossível e absurda (ver este discurso) como fazem os pseudo-tradicionalistas atuais, que alimentam um anti-sedevacantismo irracional e preferem a comunhão com a hierarquia modernista da seita conciliar. Dom Lefebvre tolerou por algum tempo os sedevacantistas dentro da FSSPX desde que se mantivessem discretos (coisa que ocorria até a pouco tempo, pelo que se tem notícia). As expulsões se devem mais à pressão da facção de sacerdotes acordistas sobre o Bispo que a uma convicção anti-sedevacantista sua. Essa convicção nunca existiu no Bispo, nem para um lado nem para o outro. Quem estuda com sinceridade suas falas e escritos notará que ele vacilava em sua posição, embora, é verdade, na maior parte do tempo adotava (infelizmente) a posição acordista e de "reconhecer e resistir". Essa sanha anti-sedevacantista não surgiu em Dom Lefebvre, mas dessa facção que agora comanda a Fraternidade e põe em risco grave a obra que o Bispo começou.

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